Manhole

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O que mais gosto no politicamente correto é o labirinto no qual ele mesmo se perde.

Devemos deixar de usar a palavra “homossexualismo”, que teria conotação de doença (reumatismo, raquitismo, sonambulismo) e passar a utilizar a neutra “homossexualidade” (como em privacidade, capacidade, honestidade).

“Homossexualite” talvez fosse injustificável, já que o sufixo “ite” indica doença, inflamação (bursite, labirintite, faringite, conjuntivite). Ou “homossexualose” (“ose” é sufixo indicador de doença não inflamatória: neurose, cirrose, mononucleose, lordose, tuberculose). Ou homossexopatia (“patia” se refere a processo mórbido: cardiopatia, encefalopatia, psicopatia ou até mesmo antipatia).

Ocorre que “ismo” não indica apenas condição patológica. Ou será que são doenças o feminismo, o lirismo, o iluminismo, o romantismo? E qual a parte boa e neutra da crueldade, da infidelidade, da infelicidade e de todas as calamidades?

Mudemos, então, o feminismo para feminidade – e o machismo para machite, machose ou machopatia (dependendo de considerar se a coisa é inflamatória, não inflamatória ou apenas doentia).

Palavras derivadas de “pênis” deveriam ser evitadas. Nada de ir de penetra numa festa, ou “penetrar surdamente no reino das palavras” (como sugeriu o Drummond), ou mesmo passear na península ibérica (ainda que “península”, por mais que seja um trecho de terra penetrando o mar não tenha nada a ver com pênis, mas com “pæne” (quase) e “insula” (“ilha”). Mas as feministas que querem abolir a palavra “península” não sabem disso.

“Vagina” seria outro termo a substituir. Sua origem é a mesma de bainha (não a da calça ou da saia, mas o recipiente onde se guardava a espada). Existiria não por si mesma, mas como receptora do órgão masculino. O politicamente correto é “vulva” (ainda que vulva e vagina sejam coisas distintas: a vagina é o tubo que liga a vulva ao cérvice e ao útero). Mal sabem que “vulva” vem de “volva” (aquele ou aquilo que envolve). Trocaram seis por meia dúzia.

Deveriam ser abolidas todas palavras carregadas de machismo estrutural. Alguns grupos feministas (ops, grupos femininadistas) já chamam seus encontros de “ovulários”, porque “seminário” deriva de sêmen (palavra seminalmente machista).

Mas “sêmen” vem do latim “semen”, que significava semente, o grão que se semeava; “óvulo” vem do mesmo idioma: “ovulum”, diminutivo de “ovum”, que significa “ovo”. O seminário é onde se semeiam ideias; um ovulário me soa ao lugar onde nascem ideias de chocadeira.

Já nos livramos (ainda bem) de expressões como “belo sexo” ou “sexo frágil”. Já ninguém se sente nas nuvens ao ser chamada de “rainha do lar” e ganhar um liquidificador ou um jogo de panelas no aniversário. Mas “abrir as pernas” ainda é sinônimo de se submeter, de não ter o controle de uma situação.

Falta muito para caírem em desuso as expressões sexistas (homem não chora, coisa de mulherzinha, falar grosso, mulher direita, seja homem, bom pra caralho). Essas, sim, são expressões que ajudam a perpetuar estereótipos.

Mas até que temos sorte, porque nos Estados Unidos se discute se não seria machismo haver a palavra “man” dentro da palavra “woman”; se “mankind” (humanidade) não deveria ser trocada para “peoplekind” (para não ser exclusividade dos “man”) e se quando uma mulher for gerente deva ser chamada de “womanager“ em vez de “manager”. Que mania (ou womania…) de ver machismo em tudo!

Em Berkeley (ver linque abaixo), tiraram o “man” de “craftsmen” (artesãos), para virar “craftspeople”. E “repairmen” (reparadores) virou “repairers”. Mas será que não teriam que tirar a palavra “pair” (par) para deixar de conter discriminação contra os solteiros?

A essa brava gente que, armada de sufixos e falsos cognatos, luta para criar um mundo mais justo, fica aqui minha sincera homenagem (e mulheragem).


Cidade dos EUA vai mudar palavras para que fiquem com neutralidade de gênero

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