Detesto que me chamem de “senhor”.
Acho falta de respeito.
Por acaso estou ficando com ruga, barba branca, bolsa nos olhos, careca, barrigudo e rabugento?
Ok, mas isso não quer dizer nada.
Se eu não fosse ateu, podia até resmungar que “Senhor é só Deus”, mas nem esse argumento eu tenho.
Sem contar que resmungar é coisa de velho, e eu só resmungo quando não tem ninguém mais novo que eu por perto.
O que, inclusive, é cada vez mais raro.
“Senhor” é tratamento devido a, sei lá, gente velha.
Quem já passou dos 40.
Quer dizer, dos 50.
Oops, dos 60.
E quanto mais velha é a pessoa que me chama de “senhor”, mais furibundo eu fico.
Furibundo não, porque furibundo é expressão de velho. Mais irado eu fico. Se bem que parece que “irado” não significa mais o que significava no meu tempo.
Aliás, é bom evitar dizer “no meu tempo”, que é sinal claro de que o tratamento “senhor” é mais que devido.
Diga “ainda há pouco, nos anos 70”, mas não diga “no meu tempo” ou “antigamente”.
Pode dar a impressão que você é saudosista.
E saudosismo é demodê.
A propósito, tem pouca coisa mais demodê que falar “demodê”.
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Desde que começaram a me chamar de “senhor” (e já faz algum tempo), estabeleci umas regrinhas básicas para quem quer tentar envelhecer com dignidade:
1. Não usar tênis chamativos. Laranja, rosa-choque, verde limão, tudo bem. Mas daqueles de luzinha, nem pensar.
2. Não usar gíria. Gíria entrega a idade, bicho.
3. Não se envolver emocionalmente com quem tenha menos de um terço da sua idade. Primeiro porque as chances de alguém com um terço da sua idade querer se envolver com você são remotas. Segundo, eu esqueci qual era o segundo motivo. Mas eu lembro. Até o final do texto eu lembro.
4. Não se paramentar todo(a) para malhar da Bodytech. Fica muito boko moko. Prefira o bom e velho moleton pra ir malhar na praça, onde tem sempre uns aparelhos coloridos rodeados de viúvas e divorciadas (e um ou outro velhinho assanhado), com quem se pode entabular um colóquio supimpa sobre osteoporose e disfunção erétil.
5. Não usar nunca as palavras “entabular”, “colóquio” ou “supimpa”. Elas são anacrônicas. Aliás, a palavra “anacrônica” também é anacrônica, apesar de ser supimpa.
6. Sair do feicebuque. Nem pensar em ter tuíter, instagrã. Muito menos tínder, grinder ou par perfeito. Todos esses lugares fazem a gente se sentir muito mais velho do que já é. Sem contar que não dá pra decorar tanta senha.
7. Ah, sim, o segundo motivo para não se envolver com alguém com menos de um terço da sua idade é que isso faz a gente se sentir ainda mais velho. Principalmente quando esquece alguma coisa e tem que fazer aquelas pausas infinitas no meio de frase que fazem a gente parecer apresentador do Masterchef anunciando o eliminado da prova.
E se com um aspecto tão jovial quando o seu, com esse seu jeito jovem de espírito e prafrentex de ser, alguém ainda te chamar de “senhor” (ou “senhora”), não hesite: desça uma bengalada na cabeça dela para ela aprender a respeitar os mais velhos.
(publicado originalmente em novembro de 2016)