Confira a coluna de hoje n’O Globo:
Brasil e Portugal já mantiveram uma relação abusiva de colônia e metrópole. Depois casaram de papel passado, como Reino Unido, e se separaram (mais ou menos) amigavelmente, com a mesma família reinando lá e imperando aqui. Tornaram-se repúblicas, penaram simultaneamente sob um “estado novo” (autoritário, nacionalista) e fizeram cada qual sua revolução (neste caso, em direções opostas; a deles mais revolucionária que a nossa).
Continuamos unidos pelas tradições e pelo lirismo, separados pelo oceano e pela língua (ou, ao menos, pelos acordos ortográficos). Formamos um sistema binário – dois fados desencontrados, dois amantes desunidos.
No final de 2015, pouco antes de no Brasil se abrir o processo que poria fim a quase uma década e meia de petismo, em Portugal os partidos de esquerda se juntavam para chegar ao poder. Costurou-se ali um acordo instável, de futuro imprevisível – daí se dizer, com desdém, que aquilo não era um governo, mas uma geringonça.
Lá, a esquerda se uniu e venceu. Aqui, unimo-nos contra a esquerda – ou, pelo menos, contra aquilo que dizia ser esquerda e fazia tudo que a esquerda sempre acusara os outros de fazer. A consequência é termos no Brasil algo que se poderia muito bem chamar de gambiarra.
A geringonça de lá eppur si muove. A gambiarra daqui até ilumina – dá para ver uma luz no fundo do poço – em que pese o risco permanente de curto circuito.
Portugal e Brasil podiam formar uma dupla sertaneja: Geringonça & Gambiarra, cada um fazendo o contrário do que era de se esperar – a direita emperrando o crescimento com crises que ela mesma inventa; a esquerda reduzindo o déficit público e fazendo o país andar.
Nem geringonça, nem gambiarra, o bom mineiro prefere um trem.
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